sábado, 28 de fevereiro de 2009

Essa rua era minha

A mãe do menininho passou a infância num bairro distante do centro de uma cidade do interior. Bairro pequeno, chão batido, pavimentado tempos mais tarde, dividido por ruas com nome de letras.

A rua da mãe do menininho era a Rua C.

C de caráter, carinho, coração, corridas, chepotas*, caminhão, criança, colegas, cepara... ops, separação é com S e não cabe na rima daquela construção.

A Rua C de tantas histórias, tantos habitantes, minha vida.

Rua C de Norma, mãe pobre que morava no quintal de uma casa abandonada, esquentando restos de comida em fogueirinha de papel, iluminada com toco de vela.

Rua C do bar de Dedé, pão de Seu edgar, picolé de Seu Renildo, caronas na esquina com a Rua K.

Rua C de Paula com bomba no "cabelo arapuá" atirada por Patrícia, a mando de Paloma, sob olhares risonhos de Edu, Eliza, Carla. A visitante Vânia, da Rua B e suas poesias. Brincadeiras com Carol, letícia, Fausta. Joceane e Lili. Carlos da ótica, Tio e Rene. Catilene. Mais tarde Rose e as gretas e os beijos no portão. João, Adilson, Marquinhos... Saudade de tia Consuelo, Célia e Gracinha.

Rua C de Cuidado de mãe que a mãe do menininho aprendeu com a sua/minha. Hoje morando num bairro grande da capital, escolheu como casa própria um prédio com o nome do filho. Continuando assim com o C de coração.

* ESQUECI DE EXPLICAR O QUE ERA "CHEPOTA".

CHEPOTA ERA A FORMA COMO UMA AMIGA CONSEGUIA CHAMAR POCHETE.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Meu filho me pediu uma boneca

Outro post grandinho, mas importante para a discussão que tentei levantar com a história de dona Cláudia Leite. Meu amigo Rafael me apresentou esta linda carta onde uma mãe narra como foi dar uma boneca para seu filho de 7 anos e desta vez é grandioso o sentido de humanidade, a alegria que senti em etsar no mundo com uma pessoa como esta. Esqueçamos as Leites que já são coalhadas.

O texto completo está no blog da autora e você clicando no título do post vai direto para lá.

"Há uns dois meses meu filho de sete anos me pediu uma boneca. Dividida entre a intelectualidade dos estudos acadêmicos e os valores que a nossa “reaça” sociedade demonstra nas questões de gênero, dei a boneca," bancando" um barulho enorme por parte da família, colegas de trabalho, ex-marido e afins. Sem contar a censura silenciosa de alguns, revelada por olhares ou gestos.
É claro que recebi apoio e solidariedade. Mas o oposto foi muito mais pesado. Confesso que compreendo. Por parte de alguns mais, por parte de outros, menos. Mas respeito.

O meu desconforto foi muito mais em relação a mim mesma do que às posturas percebidas, públicas ou anônimas, verdadeiras ou educadas. Foi duro encarar minha insegurança em assumir DE FATO uma posição em relação às minorias sociais. Foi esta imagem, refletida no espelho das relações familiares que meu filho e sua boneca me obrigaram a olhar. Tive que sustentar uma postura, na prática, que há muito considerava como minha. Em teoria. Só descobri isto quando foi com um filho meu.

Aqui faço um parêntese: enquanto eu me torcia e retorcia constrangida, fazendo como o anão de jardim "cara de paisagem”, meu filho não estava nem aí para os olhares e comentários sobre meninos e bonecas e exibia orgulhoso a sua gorducha bailarina, penteando os seus cabelos, trocando as suas roupas, mudando o seu penteado, entre extasiado e maravilhado com as possibilidades daquele "ser" de 20 e poucos centímetros e puro látex, para onde ia: no meu trabalho, no Mestrado, pelas ruas, na casa do avô, do pai...lugares públicos ou privados para este menino não dizam nada! A cada um que afirmava que boneca não era coisa de "macho", ele perguntava candidamente: por quê?

....

Optei pela lealdade aos meus princípios. É neles que está o amor incondicional ao ser humano e o respeito às diferenças, que só se consolidam se você tiver um compromisso real com a verdade. A sua verdade...

Meu filho é um ser humano. Pode ser diferente ou não no sentido convencional das opções sexuais. Mas isto não é importante. É apenas uma categoria de análise. Logo, não posso abrir mão dos meus princípios, pois eles constituem a minha identidade. Mantenho-me fiel a eles.

...

O fundamental, importante e imprescindível é o amor que sinto por este mini-humano e a admiração profunda que sinto ao vê-lo cuidar tão amorosamente do irmão menor, pela sensibilidade em perceber só de olhar meu rosto, o meu estado de ânimo, mesmo se tento disfarçar (e me alertar!), pela preocupação com a o coletivo, demonstrada nas pequenas atitudes cotidianas, como não jogar papel de bala no chão ou recolher as garrafas pets que meu pai insiste em atirar no seu quintal...

...

Sendo assim, é muito fácil ser mãe deste ser humano de sete anos que me chama de mamãe. E se ele for gay, lésbica, hetero, bi, drag, transformista ou desejar uma cirurgia de mudança de sexo, tudo bem. Mesmo. O importante é que seja qual for o caminho escolhido, que seja pautado pelos princípios humanitários. Aqueles que fazem a gente ser decente e não nos torna indiferentes às misérias do mundo. E de quebra, que ame o seu próximo, respeitando a dignidade alheia. E que sonhe sempre com um mundo melhor, como antídoto para afastar o cinismo que ronda o cotidiano da perversidade.

Eu te amo meu filho.Por tudo. Mas principalmente por me fazer olhar, de forma corajosa para dentro de mim mesma.

Com amor,

Mamãe."

Nem te conto

Igreja de pedras construída por escravos. foto de Luciana Ferraz


Pela estrada a fora eu vou.....

Pela estrada de asfalto verde desbotado, à margem de uma paisagem enlouquecedora, chegando numa cidade linda para correr atrás de careta e fanfarra, acompanhado de amor e amores, eu passei meu carnaval. Conquista, Brumado, Rio de Contas...

Perdi as contas dos momentos felizes. História colonial, natureza e gente boa.

Ainda estou processando tudo qui dentro, quando voltar à cidade d'Oxum eu conto melhor minhas emoções.




Cachoeira de Rio de Contas. Foto de Luciana Ferraz

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Contra a homofobia

Este post é grande como grande ainda é o preconceito que causa tanto constrangimento e dor. No carnaval, onde esses ídolos fabricados têm tanta responsabilidade perante o público, é bom que façamos uma reflexão sobre quem queremos que sejam nossos representantes, mesmo que seja na folia. Neste período há muitos casos de mortes por homofobia e os "machos" que comem os "menos machos" se acham no direito de matar porque estes últimos lhes satisfazem o desejo enrustido, mas revelado (desculpado) em alguns goles de cerveja.

CARTA ABERTA À CLÁUDIA LEITE
por Toni Reis

Claudia Leite, sou Toni Reis, 44 anos, paranaense, moro em Curitiba. Sou Gay, sou casado com meu marido David Harrad há 18anos e sou muito feliz e realizado como profissional e pessoa. Atualmente, sou presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays,Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) que é uma entidade nacionalque congrega 203 organizações afins, o que reflete parte da minhatrajetória, mas neste momento, quero fazer um depoimento pessoal.

Claudia Leitte, gostaria de dizer que amo você pelo talento comque você se expressa. Seu repertório, sua alegria de viver quepara passa mim. Sou seu fã de carteirinha. Simplesmente adoro você eademais você é linda.Com relação à sua entrevista sobre a nossa questão na qual vocêdisse "Eu adoro os gays, mas prefiro que meu filho seja macho" e seumarido Márcio Pedreira, completou. "Deus me livre (do filho ser gay). Eleserá bem criado".

Quero dizer que fiquei muito decepcionado com a noção errônea de que éa criação que faz com que alguém seja gay, ou não.Tudo isso me fez lembrar o que aconteceu comigo quando, aos meus 14 anos,falei para minha mãe: "Mãe, sou gay."Quando falei para minha mãe e minha família, todos e todasficaram chocados e tentaram durante seis anos da minha vida (oque foi um inferno na terra) me "curar" de todas as maneiras.Levaram-me para a Policlínica da cidade de Pato Branco e pediram paraser examinado por um médico, achando que eu tinha um problemamédico. Mas o médico falou que eu não tinha um problema de saúde, e quehomossexualidade não é doença, e me encaminhou para uma psicóloga. Elatambém me falou que a homossexualidade não constitui doença, nemdistúrbio e nem perversão. Na verdade, ela estava bem à frente do seutempo, visto só foi em 1999 que o Conselho Federal de Psicologia baixou umaresolução que entre outras determinações, estabelece: "os psicólogos nãoexercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos oupráticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientarhomossexuais para tratamentos não solicitados.

"Mas, não contente, minha família Católica, que bem me criou, pediupara eu falar com o falecido padre da nossa cidade de Quedas doIguaçu , e o mesmo pediu para eu me afastar do Encontro Vocacional eda Santa Comunhão, até que eu me curasse do "pecado nefando". Pediuque fizesse uma novena para Nossa Senhora do Perpétuo Socorro,que eu me curaria, mas se eu tivesse uma recaída, era para voltarao primeiro dia. Tive várias recaídas, afinal a orientação sexualde um pessoa não é escolha e tampouco opção. Eu simplesmente era gay.Tive que voltar várias vezes ao primeiro dia da novena, que játinha virado uma quarentena.Não contentes, minha família e meus amigos me levaram para a igrejada Assembléia de Deus para receber benção. Mas não deu certo.Levaram-me para um centro espírita e o pai de santo me falou quetinha a pomba-gira. Fizemos "os trabalhos", mas não deu certo.Fizeram de tudo para me "curar". Por último, tomei xaropes comamendoim e tudo mais para que fosse "macho", mas não deu certo.Como meu irmão disse depois, sou macho por ter assumido logo cedoo que era. Aos 20 anos, me deram a derradeira última possibilidade:era tomar leite de colostro de égua para me curar.

Felizmente, não deu certo.Hoje estou aqui, bem criado, como especialista, mestre e doutorando,e feliz e realizado com meu marido. Minha mãe, depois de tudo queaconteceu na minha adolescência, em 1996 se propôs a casar com meumarido (que é estrangeiro) para que ele pudesse ficar no Brasil,comigo. De total fundamentalista, minha mãe se tornou uma grandecompetente cultural. Acredito na mudança de pensamento das pessoas.Falei um pouco de mim.

Quero que entendam, Cláudia e Márcio, que a homossexualidade não é tão simples que se possa dizer "eu quero quemeu filho seja macho ou fêmea." Não é uma questão de educação.Não é uma questão de religião, mas sim uma questão de ser. E como dizia Aristóteles, a finalidade da vida é ser feliz.

A partir da minha experiência e algumas leituras, nestes 25 anos deminha militância na comunida LGBT, sempre quando acontece qualquerdepoimento ou ação contrários aos homossexuais, procuro classificar em oito etapas da competência cultural de cada um, que é uma escala, da maishomofóbica à situação ideal que queria.1) A situação mais homofóbica é a nazista, que mata o outro porser diferente. No Brasil temos muitos casos. Segundo o Grupo Gay daBahia, são 2.800 caso de assassinatos. Hoje no mundo, ainda há setepaíses onde há pena de morte para os homossexuais.2) Depois, vêm os fanáticos, que morrem por sua causa. Hoje nomundo, há 83 países que criminalizam a homossexualidade.3) Depois, há o fundamentalista que fala que como está escrito na Bíblia(ou outro livro sagrado) que somos pecadores, mereceremos sercurados. No Brasil, os fundamentalistas são nossos piores adversáriospara aprovação das leis que protegeriam nossos direitos. São estesreligiosos fundamentalistas, que no nome do deus deles, nosdiscriminam, incentivam a violência e fazem oposição aos nossosdireitos.4) Depois, os preconceituosos que não entendem nada dahomossexualidade ou têm informações distorcidas, se utilizando deestereótipos e falando mal da nossa comunidade e contra nossosdireitos.5) Depois vêm os tolerantes que não nos aceitam, mas convivem, no intuitode nos mudarem, se pudessem.6) Em seguida há as pessoas que nos respeitam. Não chegam a nosaceitar, mas respeitam nossos direitos e nossa forma de ser.7) E depois as pessoas que nos aceitam como seres humanos e comocidadãs e cidadãos.8) E por final, há as pessoas que são competentes culturais. São aspessoas que não discutem a nossa situação, simplesmente convivem.Afinal, o fundamental é viver.

Cláudia, nessa escala, acho que você está entre uma pessoa tolerante e uma pessoa que nos respeita. O que você acha? Claudia Leitte, gostaria muito que você se pronunciasse a favor doProjeto de Lei da Câmara nº 122/2006, que criminaliza a Homofobia ea iguala ao racismo.Claudia e Márcio, quero que seu filho ou sua filha seja muito feliz,que tenha muita saúde, independente da orientação sexual ouidentidade de gênero. Se tiver seu talento, será maravilhoso(a). Ou não.

Toni Reis

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Depois de me perder da cadeira, eu perdi o carnaval

Eu tão longe aplaudindo o carnaval que nem começou.

Quem me conhece sabe o quanto eu amava o carnaval e me esbaldava tanto ao ponto de chegar em casa em companhia da LIMPURB que lavava as rodas da cadeira para não levar porcaria comigo, mas desde 2005 tenho viajado e fugido da festa, exceto em 2007.

Este ano repito a ausência com uma pontinha de "queria ver". Há alguma coisa nova começando neste carnaval 2009. Sinto uma possibilidade de respiração, ainda que em dose homeopática, porque a indústria do Axé é muito rica e forte, mas tenho certeza que este ano será mais gostoso brincar. Com o projeto da Secult de edital para trios independentes, será possível ver os Novos Baianos (se eu ficasse, era nesse trio que vcs me encontrariam chorando bêbado de saudade dos carnavais que não conheci), Lobão, Ramiro Mussoto, Retrofoguetes, Mariene de Castro, Radiola, Lucas Santana, Roberto Mendes, Raimundo Sodré, samba, rock, eletrônica, guitarra baiana, atabaque, berimbau.... será possivel ver minhas meninas do TRÊS NA FOLIA - Sandra Simões, Claudia Cunha e Munuela Rodrigues - que sairão domingo, 12h, na Avenida (neste eu também seria visto).

Eu amo o carnaval, embora ele venha precisando de reformulações e políticas para o povo brincar sem a preocupação se volta para casa. Eu amo o carnaval pela alegria, pelos milhões de beijos na boca, pelos encontros, pelas despedidas, pelos amigos, pela bagaceira.

Eu sou bagaceira mesmo! Alguém acredita que num dia desses de Mascarados, eu nas costas de um amigo, me perdi da cadeira de rodas? Ficamos o percurso todo da Barra procurando e perguntando "você viu uma cadeira por aí?", eles respondiam "eu vi uma cadeira atrás do trio", "estava aqui, mas não vi mais", "numseiquem tava empurrando uma cadeira com um cachorro em cima" e eu nas costas do amigo a avenida inteira preocupado com o cachorro. Quando encontramos, uma amiga minha empurrava a cadeira e no assento estava o chapéu de pelúcia da fantasia do camarada que me carregava. oh povo doidho no carnaval!

Eu amo o carnaval, mas ele estava precisando desse sopro de inteligência de músicos nos trios independentes. Não dava mais para sair às ruas e o tempo todo escutar a mesma música, ver a mesma dança e abadás iguais. O gostoso é ser diferente, é se perder e saber que vai se achar mais feliz no dia seguinte e voltar e sentir saudade torcendo que o ano passe mais rápido, porque neste a gente não conseguiu beijar aquele que estava no outro bloco.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Eu sou VIP

Passei na porta do Iguatemi agora e vi, como tenho visto pela cidade, que o "2222 é a grife da alegria". Fiquei pensando, tentando entender o que isto significava. Não, não estou fora da realidade e sei que às vésperas do carnaval essa frase se refere ao camarote do ex-ministro (graças a Deus!!!!). Não é sobre o 2222 que eu tentava entender, era sobre a "grife da alegria". De que alegria eles estão falando? Grife?

Acho que nunca serei VIP. Não tenho alma de grife. Não gosto de fingir passar um carnaval na Bahia ouvindo música eletrônica (que eu adro!), em cima de tudo/todos, sem pisar a rua porque uma Besta vem me pegar e levar, não sentir a gente que pula e faz o carnaval. O que fazem aqui no carnaval?

Vi Cléo Pires cheia de segurança do ex-ministro no meio do povo, saindo do espaço reservado aos escolhidos na frente do trio, se dirigindo ao camarote. Para que aqueles seguranças? O que faz aqui no carnaval? Se não quer ver/sentir gente por que não assiste de casa?

O que leva uma pessoa patrocinar isso? Esbanjar tanta comida para quem já ta cheio de comida?

Os milhões que este povo recebe, não daria para fazer uma ação melhorzinha? Pagar melhor aos cordeiros que ganham 10 reais o dia seria uma boa idéia. Dar um lanche melhor a esses trabalhadores que agridem seus iguais em detrimento do bacana que está dentro, seria bom também. Me assustei quando vi cena igual a isto: Um bando de gente pobre batendo nos pobres que se ousavam a encostar ali. Eles de costas para o bloco, surrando, só vendo quem estava fora. Eles sabiam quem estava dentro? Alguém sabe do que estou falando? Eles vêem o carnaval? Eu, pobre, vi e não gostei mais do carnaval.

Sou pipoqueiro! Adoro trio independente e me arrependi de duas vezes que quis tirar onda de bacana indo a camarote convidado por amigos. Não gosto de ser Noé. Ver a miséria pegar fogo lá em baixo e eu em cima da arca protegido de tudo. Que ilusão!!!

Desceu, acabou o carnaval, Rapunzel perdeu sua torre e acabamos todos no mesmo nível e alguns acabam mais embaixo.

É, sou pobre, tenho alma de gente! Sou VIP!

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Eu em Shakespeare

Estou todo todo!!!!!!

Clicando no título vai direto ao site do Ano da França no Brasil. O melhor é que estou em dois projetos neste evento.

A "Tempête" acontecerá em Maio/Junho/Novembro, Salvador/Lyon.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Aquele senhor

Calça social desbotada e camisa de botão manchada. Cabelo quase nenhum na testa, grudado na nuca. De suor ou creme? Todo arrumado, com elegância e bengala. Isso me emocionou, pensando na preparação para sair ao trabalho, na arrumação. Escolher entre as poucas roupas, uma que lhe desse um ar de respeito, de trabalhador, que lhe caísse bem e que fizesse as pessoas até pensarem em lhe ajudar.

Aquele senhor me lembrava meu avô. Se fosse ele a passar por entre os carros de vidros fechados, pedindo um trocado para sua fome? Naquela idade, aquele senhor não tem o que comer, não tem aposentadoria, não tem um boné para proteger sua cabeça do sol. Eu dentro do táxi com ar-condicionado, chorava e me envergonhava. De que? Sou culpado por etsar ali dentro? Sou o responsável por aquele senhor está ali fora? Queria colocá-lo dentro e levá-lo para casa. Que casa? Para que, meu filho? Para que, meu Deus?

Essa imagem não me saiu da cabeça. Aquele senhor recostado na parede da lanchonete, descansando à espera do sinal vermelho de um sinal verde que nunca o virá passar.

Cheguei em casa e no corredor do prédio o cheiro de comida gostosa me deu náusea.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Cachos, calcinhas e carinho

"Eu vou morar na casa de tia Dinorah." Vinha com dois, três anos, a menininha com suas gordurinhas, mochila com a mamadeira e duas calcinhas de babado. Atravessava a rua e, talvez, pensasse que atravessava o mundo. Vinha pequenininha, linda!!! Cachos, calcinhas e carinho.

Hoje, mulher feita, atravessou o Brasil, descobriu o mundo e continua linda com seus cachos e carinhos. Meiga, decidida, mulher... Fez festa de gente grande, como não podíamos imaginar grande aquela menininha. Comovente ver aquela noiva, linda como num editorial de moda de revista de longe. Deslumbrante! Assisti a tudo com o coração feliz e rezando (ao meu jeito) para que sua vida fosse sempre bela e maravilhosa como a festa que ela nos presenteou.

Ela sabe que pode atravessar, quando precisar ou quiser, para esta casa que sempre será sua, embora não esteja mais do outro lado da rua.