terça-feira, 29 de setembro de 2009

Talvez não fosse

...O que sempre pensei que fosse meu sonho, talvez não fosse...

Com essa rebordosa, fui tomado nos primeiros minutos de filme e depois daquela cena eu jé era Daigo, personagem de A Partida, película japonesa que acabei de ver na Sala de Arte - Cinema da UFBA. Num momento de tantas contestações em que me imponho, ver um violoncelista dizer isso de seu sonho, depois assistir a um funcionário público brigar com a mãe porque a casa de banhos não lhe dá segurança e da transformação do músico de orquestra em agente funerário que embeleza os mortos para a passagem, foi como assistir meus sonhos sendo contados na história de outra pessoa.

O violoncelista japonês poderia ser um dançarino baiano... Ah não falarei mais disso. Meu queixo está doendo de tanta queixa.

Como é bom ser público e compartilhar dos sonhos dos criadores e ser tocado por seus trabalhos e ser co-autor de suas obras e de ser contaminado por elas.

Há uma semana assisti também o sensível trabalho de Lucas Valentim, Troca Imediata de Saliva e Suor, que transborda beleza e delicadeza, como ele faz normalmente em sua vida. No espaço minúsculo da bilheteria do Teatro do Movimento, ele nos segreda seus sentimentos, suas inspirações, suas aspirações. Tudo tão delicado que parece um sonho. Trabalho de menos de 10 minutos, mas que se torna eterno nos poros, ouvidos, nariz, olhos, coração. Fico com pena de quem não experiencia momentos sutis como aquele. Fiquei feliz de ter vivenciado aquilo e de como a troca reverbera em mim até hoje e para sempre. Queria dar de presente a meus amigos.

...O que sempre pensei que fosse meu sonho...





quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Um caso trash sem fim ou estorinha para desanuviar noite pesada

Faca em punho, correndo sozinho na rua escurecida pela medrosa lua escondida em cinza céu, saiu vestido de preto. Pretinho básico combina com tudo, ainda mais nesta situação: prévio luto para crime premeditado.

Olhos vermelhos de fúria, dentes travados cantarolando a música da ligação a cobrar "ta rã ta rã... diga seu nome e o lugar de onde está falando". Tá na casa do caralho!

Os passos pesados, raivosos, pés firmes que seguiam sem ajuda dos olhos que já não viam por onde ia. Dispersou-se numa bundinha preta arrebitada embaixo da marquise de um supermercado. Calcinha enfiada, camiseta de propaganda surrada, papelão. O pau ameaçou subir, mas o pé seguiu.

O ouvido tentava lembrar o que aquela voz de trote falava ao telefone, de onde estava vindo, o que acontecia, com quem?

Viu-se sozinho em casa, babando o sofá, esperando por ela.

Telefonetrotecornovizinhovingançaruabundafaca.

A mão sangrando a lâmina de lágrima que não escorria. O pé estancou. A chuva desabou levando a insensatez.


terça-feira, 22 de setembro de 2009

O descanso de Dirce


Não sei se ela me lembra minha avó, o cheiro da casa quando eu era bem pequeno. Não sei o que em mim me comove tanto a morte de Dirce Migliaccio. Talvez a falta de sensibilidade do mercado da arte em que vivemos que não aproveita talentos como o dela. Talvez eu projete a minha vontade. Não sei... Na carta que escrevi a Lídia Brondi eu já falava em Dirce e agora também.

Para mim

Foto de Diane Portela

He's a man who never stops
He walks, he walks, he chute
Il se relêve yahoo yahoo
He's a man who never stops
one day he c
ourt il courl il tombe et
ne se relêve plus, n
ever never. He can't
pleurer alors il danse yahoo yahoo
que c'est BEAU!!!

Helene Charles

Foto de Edu O.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O término da viagem

Encontraram-se bem por acaso. "Coisa do destino", o mais bestinha falou sem conter o nervosismo. O fato é que estavam a trabalho, viajando para fazer show em festival de música no Nordeste e o outro para dar palestras a executivos. Terno, gravata, pasta, chinelo, calça de cordão e barba. Continuavam os mesmos na aparência e se atraíam por isso. Como diz o outro, o destino se incumbiu de colocá-los lado a lado no avião e papearam a viagem toda. Negócios, carreiras, besteiras, família, mas nada do amor antigo. Não pisavam em terreno perigoso que perigavam afundar-se mais uma vez. Não que os corações não tivessem saltitado quase saindo pelos poros excitados de lembranças, mas o término havia sido doloroso demais para tentarem repassar o tempo que estiveram juntos.

A mão de um, gelada, suava pedindo a mão do outro. O abraço vazio sem retorno da pasta quase gritava pelo aconchego vizinho. Não reparavam na insistência das barras de cereal. Recusaram ao mesmo tempo. Não poderiam gastar aquele momento em abrir embalagem, morder, mastigar... Queriam comer os minutos juntos.

A viagem passou sem se sentir. Passageiros em escala, por favor mantenham-se sentados. Mantiveram-se mudos durante a descida do avião. Olharam-se sabendo que o principal nunca seria dito. Despediram-se com o cichê do foi um prazer.

A viagem para um continuou e para o outro nunca havia chegado lá.

domingo, 13 de setembro de 2009

A dança do lugar




Esta primeira semana do nosso intercâmbio Euphorico a céu aberto foi muito intensa, como sempre. Experiência junto à comunidade do Engenho Velho de Brotas. Crianças participativas, ativas, senhores jogadores, passantes, cachorros, cheiros, suores, sorrisos e a dança. Dança do lugar.

Treinamos a observação, a chegada num espaço que não é nosso e o respeito ao ambiente alheio. Sensação a todo instante. Instantes Poéticos.

Nestes primeiros dias, tentativas de propostas novas, com gente nova, Mirella Matos, atriz convidada pelo Grupo X. Um Euphorico novo, mas o mesmo em sua essência. Muito amor, troca, sorriso, alegria, vivência intensa entre corpos e corações.

Intensivão!!!!!!! não é Mika?

Na Escola Contemporânea de Ballet experimentamos o oposto. Sala fechada, propostas mais fechadas e nem por isso menos ricas. A generosidade de portas abertas sempre fazem a diferença em dias de portas fechadas para apoios à cultura.

Obrigado à Escola Contemporânea de Ballet, muito obrigado ao Cine Teatro Solar Boa Vista, às crianças da comunidade e a todos os seus habitantes por nos receberam de braços abertos.

Esta semana agradecemos imensamente ao Empório Maranello (Rio Vermelho), Café Garagem (Canela), Bar Bagacinho (Barra) que nos apoiaram com a alientação dos convidados. Obrigado a Junior, Jamiller, Nei, Iara, Dinorah, Diane e sua família, Daniel, Victor Venas, Grupo Vozes do Engenho, Marcelo Jardim e a todos que fazem esse projeto acontecer.

sábado, 12 de setembro de 2009

Recado de despedida para esta vida


Foto de Diane Portela

Vamos fazer um trato?

Cansei dos teus contos, teus cantos

Vou pagar minhas contas

Quero me separar de você

Nossa relação projetada perfeita desde o início

Hoje perdeu seu encanto

Não nos combinamos mais

Sente falta de minha ingenuidade

De minhas artes, de meu frescor

Me apeguei a números que somaram por mim

Apaguei minha luz

Esqueci de você

Sinto saudade de tua calmaria

Do sorriso honesto,

Do pensamento vazio

Nós que nos aceitamos com nossa deficiência

Nosso sonhar livre

Brigamos por coisas poucas:

Um tempo que não temos

Uma carta que já não escrevo

Cores que já não sei fazer

Hoje choro por nós dois

Não dá mais certo

Insistirmos num verdume

Numa imaturidade adolescente

O tempo nos amadureceu

Nos tirou do pé, sem pedir licença

Não percebi e caí

Perdido que estava com as coisas que descobri:

Cores, formas, beijos, amores negados...

Você, egoísta, percebeu a mudança

E sem me comunicar seguiu sozinha

Não consegui te acompanhar

Me desculpe, sou artista

Estou querendo produzir

Esta loucura que me assola

Este medo que me apavora

Me induz a querer mudar

Mudar de você

Com mania de autor

Embora criatura

Cansado de ser herói de minha própria história

Pensei num final diferente

Do que tinham pensado para nós

Sem iluminação

Sem público

Sem aplausos

Uma partida sem volta

Uma viagem sem direção

Fiquei doente

Querendo me remediar

Para deixar de sentir as dores que estavam em mim

Agora, o tempo que me é curto demais

Não me deixa concluir

Estou largando você

Estou indo para outro lugar

Estou indo embora, querida!

Procurar-me no mistério

Querendo encontrar minha outra vida

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Ne me quite pas (da série música chiclete)

Morro de medo de saber depois que fui um erro na vida de alguém que a mim foi tão importante. Vixe, nem pensar! Nem falar, porque as palavras têm poder e sei lá o que vem me acontecer. Escuto "Ne me quite pas" com Maria Gadu no repeat e meu peito dá nó, minhas mãos passeam o mouse no passado e vejo tanta beleza, mas tanta beleza que me trouxe tristeza quando o presente chegou.

Elephant gun (da série músicas chiclete)

Quando se aperta o botão da tristeza, o que fazer para a alegria não ficar de mal?


Se eu fosse jovem, eu ia fugir desta cidade
Eu enterraria meus sonhos ocultos
Como eu, nós bebemos para morrer,
nós bebemos essa noite

Beirut

http://www.youtube.com/watch?v=eWcfN5YOj5o&feature=related





sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Caso Marcelo Lima

Este caso foi com um amigo nosso, menino nascido na minha cidade, com tanta vida pela frente. Aqui está a carta de uma mãe sem seu filho e a mercê da lei. Lei?

Caros Amigos,

Chamo-me Célia Lima, mãe de MARCELO LIMA, que no dia 08/10/2006, aos 27 anos, foi assassinado no OKTOBER FEST, em Feira de Santana-Bahia.

Meu filho, Marcelo Lima, nasceu em Santo Amaro da Purificação-Bahia, formando em Engenharia Civil pela Universidade Católica do Salvador (2007.1) sempre dedicado, era destacado em todos os estágios como: Liceu de Artes da Bahia, MRM, Reforma do Fórum Ruy Barbosa, Construção do Restaurante Gerimun, entre outros.

Meu filho era um jovem feliz. Sua alegria, fidelidade, humildade, sinceridade, contagiava todos o que conhecia. Como mãe é difícil falar sobre Marcelo, ele foi uma benção de Deus em nossas vidas. Acredito que neste momento ele está ao lado do nosso “Pai Celestial”, e que já foi recompensado pelo bem que fez aqui na Terra. É o que me conforta...além da certeza, de que um dia, poderei reencontrá-lo e não mais nos separar...

Marcelo tinha uma vida inteira pela frente, mas teve seus sonhos, sua carreira e projetos interrompidos brutalmente por assassinos que continuam circulando livremente, curtindo a vida como se nada tivesse acontecido, como se a vida de um inocente não tivesse nenhum valor.

É doloroso demais perder um filho, principalmente nessas circunstâncias. Minha vida não tem mais sentido, perdi toda a alegria de viver. Minha família desestruturou-se e todos nós estamos sofrendo muito. A dor que sinto causada por esses criminosos é indescritível, as lágrimas, a saudade, o espaço deixado por meu querido Marcelo jamais será preenchido.

Marcelo foi agredido na área VIP do camarote do OKTOBER FEST. Sempre solidário, ao avistar seu amigo sendo agredido, dirigiu-se para prestar-lhe socorro, mas esses assassinos dotados de uma fúria animal, desferiram-lhe um soco, vindo a cair sem chances de defesa. Insatisfeitos, atingiram-no com inúmeros chutes na cabeça que geraram lesões fatais em pleno local da festa.

Caros amigos, os assassinos continuam soltos e impunes. PEDRO HENRIQUE OLIVEIRA e DERALDO PEREIRA FILHO continuam agindo como se nada tivesse acontecido usufruindo de grandes influências políticas e financeiras para que o caso de meu filho se passe apenas como mais um sem punição.

Sou refém diante de tantos presentes dados aos assassinos graças as brechas do “Maravilhoso Código Penal Brasileiro”. Onde está a justiça de nosso País? Impunidade gera Impunidade e Fomenta a Perpetuação do Crime. Sinto-me impotente diante de tão grande poder dado a estes “Poderosos Criadores de Leis” que punem as vitimas e beneficiam os assassinos.

Sou mãe e sinto-me condenada pelas leis brasileiras que dá brechas e não permite punições rígidas e severas para os assassinos. Sou punida pela dor, lágrimas, prisioneira da saudade deixada pelo meu querido filho que foi tirado de mim de uma maneira tão cruel. Precisamos de JUSTIÇA. Precisamos acabar com essas Leis que sempre beneficiam bandidos e punem as vitimas impedindo o Poder do Supremo da Justiça.

Amigos, a dor que invade o meu peito jamais poderá ser recuperada. Sou mais uma vitima de uma barbaridade e mais um caso de luta por Justiça...Ajude-me, a divulgar este caso, vamos lutar por punição, concretizando assim mais um passo da nossa longa e árdua caminhada rumo a Justiça e em prol da Paz do nosso País.

Célia Lima

Mãe

Contato: www.casomarcelolima.com.br

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Gato preto

Chorar foi a primeira coisa que lembro de ter feito

Antes mesmo de ver o sol,

Ouvir tua voz no meu ouvido

Ou sentir um beijo-carinho na minha testa

Chorei, talvez, pressentindo o meio dessa história

Meio, sim! Pois ali foi o começo,

E agora não estou propriamente no fim

Caminho para ele, mas acho que falta ainda um pouco

Aliás, lembro-me que chorar

Não foi a primeira coisa que fiz

Falaram-me que eu doí

Então doer foi a minha ação original?

É, eu doí muito!

Talvez tenha chorado de dor

Parado aqui nesta rua, esta claridade me dói!

Lembro que quando saí do escuro pela primeira vez

E descobri a luz, me assustei!

Eu que já doía, juntei o susto e chorei.

Então por que choro agora?

Se já sou acostumado com a luz

E as coisas já não me doem tanto!

Estou apático, chorando!

Não concordo com o meu direito à vida

Ninguém teM o direito de fazer a vida doer

E eu dou a minha vida

Eu corto, dopo, passo fome, drogo, risco, mal digo minha vida

Ela, coitada, que é tão inocente quanto eu!

Ela que também não sabia que ia nascer!

Ela que nem tem consciência!

Ah! O problema é dela!

Ela que fique esperta!

Acorde antes de atropelá-la!

Não bebo há duas semanas e meu fígado sente falta,

Está de mau humor

Falo isso porque vejo aqui no canto, um resto de cerveja quente

Minha vida diz para eu não tomar

E eu tenho impulso de desobedecê-la

Corro para pegar,

Escorrego, caio e derrubo o copo

Lá se vai a última gota do que eu queria

Vai direto pra boca de um imbecil cachorro que lambe o chão

Quase dou um ponta-pé nele,

E me abaixo para lamber minha cerveja

Mas tenho medo da morte,

Tenho medo de dentes

Roendo as unhas quebrei um canino.

Por que os cães não quebram os dentes?

Todos neles são caninos, né?

Eu que só tinha dois, fiquei com o canino esquerdo

Posso mordê-lo, seu quadrúpede, com o esquerdo

E aí será de igual para igual

Dizem que cachorro faz companhia ao homem

Faz uma “uma companhia retada!”

Só se for para os idiotas

Que não sabem viver fora do seu próprio eixo, seu umbigo

Que não se interessam pela história dos outros

Nem querem ouvir verdades quando desabafam

Para o irracional que abana o rabo e faz festa

Como se a pessoa tivesse acabado de contar uma piada

Oh! Bicho burro é cachorro!

Odeio gatos, mas eles tem isso de bom:

Não se aproximam nem quando você está bem

Nem quando se debulha em lágrimas

Você que amadureça resolvendo seus problemas sozinho!

Ele só quer sua comida e o conforto do seu sofá

Perdi um gato há duas semanas

Cansou de minha comida e caiu da minha cama

Tinha pêlos demais, era preto meu gato!

Os olhos assustadoramente amarelos!

Uma elegância comum em todos os gatos,

Mas como era o meu, eu achava o melhor, o mais bonito

O lombo exageradamente macio

E o rabo sempre entrelaçado em mim

Gato preto!

Volta gato “feio”!

Gato traidor!

Seu arranhão me dói!

Você me deu azar e todos me alertaram para isso

Não dei ouvidos, pois você era mau talismã

Ah! Esse cachorro me lambendo!

Parece a solidão sentada aos meus pés se apoiando em meus joelhos

Solidão imbecil! Claridade imbecil!

Bem no meio da histórias parece que acabo de nascer

Primeiro me dói e agora começo a chorar em plena luz

Deve ser porque no escuro eu me iludisse,

Pensando estar escondido no abraço de meu gato preto

Quem acendeu esse sol, favor desligar!