quinta-feira, 30 de junho de 2011

Com as bençãos de tia Mabel

Edu, penso que ser marinheiro de primeira viagem é uma delícia. Sai pelo azul do mar sem saber o que será depois da primeira onda, da primeira espuma, do primeiro porto. Sai...

Você está assim navegando bonito. Ouvi e vi Judite com você e agora li junto, e olhei longe e vi a sua viagem, a viagem de Judite a viagem de tanta gente, a viagem de todos nós.
Gostei da idéia do livro e espero conhecer em breve "o retrato" feito por Caio. Não encontrei nada a corrigir ou mudar no seu texto. Saiu pronto como saem as borboletas dos casulos.
Dinorah e Paloma são de muita sorte por você viver perto delas, com elas, nelas... O comigo-ninguém-pode aí é "Comvocês ninguém pode"!
De cá recebo a minha fatia de sorte por você lembrar de mim e falar das minhas viagens com tanto carinho. Desejo boa sorte sempre. Sucesso!!! Um beijo

Mabel

Por que as palavras não saem?

O que é isso que me dá quando entala o choro que quer se misturar com o riso?

Que sentimento é esse de alegria extrema, ansiedade e olhos mareados?

Por que as palavras não saem e esse nó?

E este sol queimando lá fora enquanto a casa fria?

Judite nasceu assim, quase como num dia feito esse. Desde ontem experimento emoções diferentes e sorrio e choro e calo e falo......

Minha mãe viajou deixando a casa vazia como há muito tempo não sinto. Sair para realizar sonhos. Há felicidade maior do que esta? Voar, ir longe e voltar carregada de bagagem, humores, sabores, luminosidade, calos e poeiras. Então, por que esse nó?

Ontem reencontrei um amigo, daqueles que transformam a vida e vieram tantas lembranças, tanta coisa. Voltou aquele adolescente começando a conhecer as coisas da vida... VIDA... assim me chamavam.

Amanhã será oficialmente o livro de Judite. Ele já anda circulando por aí há algum tempo, mas sem ritual, sem essa coisa de convidar amigos e parceiros para divirem o momento. Lembrando de tantos e Maria Sampaio estampada, comemorando o que ela se empenhou em dar certo. Nos agradecimentos tem Maria, tia Mabel que me escreveu um texto tão lindo de navegador na primeira viagem, tem Rudá que tinha nascido quando o livro foi criado, tem mainha, tem Paloma, tem Nei, Vitória e Laura. Tem os amigos todos que ilustraram: Fau, Déa, Luca, Dani, Zeza, Will, Fafá, Keu, Ed, Hugo e B. Tem Sérgio e Zunk que diagramaram. Tem Nádja que corrigiu. Tem foto de Caco. Tem tanta coisa ali dentro que me emociono ao ver inteiro em minhas mãos.

No início da madrugada chorei ao ver Renata Sorrah deslumbrante com sua Heleninha Roitman.

Hoje acordei cedo para me encontrar com a galera de Judite e me emocionei também com os sonzinhos de Drica e Lu. O carinho delas, a força que a lagartinha tem mesmo quando não aparece e ficamos contando a vida da coitada.

Agora pensando em mainha, em Judite, em mim, Heleninha, em todo mundo. Pensando nesse mundo tão grande do tamanho de uma ervilha. Esse mundaréu que Judite já me fez conhecer, viajar e encontrar tanta gente, tanta gente......

Como retribuir à criatura o que faz com o criador?

foto Célia Aguiar

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Dança, Lançamento de Livro e Contação de História na Livraria Cultura

Judite resolveu me dar um presente, se coloriu de diversas formas, cores e técnicas e inventou ir morar num livro lindo, colorido, contando para as crianças sua história de medo, transformação, vôo e liberdade. Diz que criança grande também pode levá-la para casa e voar junto com as pipas. Sei não, essa Judite inventa cada uma! Então, dia 01 de Julho (sexta-feira), as 16:30h, na Livraria Cultura do Salvador Shopping, haverá uma apresentação especial do espetáculo, Judite quer chorar, mas não consegue! para todas as crianças, onde realizaremos também o lançamento do livro infantil com Contação de História baseados na lagartinha Judite.

E não esqueçam que nós (eu e Ju) estaremos lá para dar autógros.

A coreografia e o livro foram criados por mim, Edu O. As ilustrações por diversos artistas.
A Contação de História será feita por Drica Rocha e Ana Luiza Reis que também estarão em cena fazendo a musicalização, ao vivo, para Judite dançar.
Quem fará a luz será Milianie Matos
E a produção, maravilhosa, da Ampla Produções e Eventos

Esperamos todos lá e se puderem saiam fofocando essa nova da lagarta mais medrosa e mais linda que conheço.

ilustração de Fafá Daltro

quinta-feira, 23 de junho de 2011

São João, Xangô Menino

(Doces Bárbaros)

Ai, Xangô, Xangô menino
Da fogueira de São João
Quero ser sempre o menino, Xangô
Da fogueira de São João

Céu de estrela sem destino
De beleza sem razão
Tome conta do destino, Xangô
Da beleza e da razão

Viva São João
Viva o milho verde
Viva São João
Viva o brilho verde
Viva São João
Das matas de Oxóssi
Viva São João

Olha pro céu, meu amor
Veja como ele está lindo
Noite tão fria de junho, Xangô
Canto tanto canto lindo

Fogo, fogo de artifício
Quero ser sempre o menino
As estrelas deste mundo, Xangô
Ai, São João, Xangô Menino

Viva São João
Viva Refazenda
Viva São João
Viva Dominguinhos
Viva São João
Viva qualquer coisa
Viva São João
Gal canta Caymmi
Viva São João
Pássaro proibido
Viva São João

terça-feira, 21 de junho de 2011

São João (da série Revivendo o passado)

Confesso que na infância São João não era minha festa preferida, mas ultimamente, talvez por não ter estado muito nos festejos juninos por causa de viagens, tenho sentido uma alegria "fogueirando" meu coração quando se aproxima a época dessa festança gostosa. Gostosa mesmo, com tantos sabores, licores, amores de casamento na Roça, viveres....
Adoro essa música e tantas outras. Queria que a fogueira de São João clareasse as idéias de meu povo e como num pipocar de bombas o bem se fizesse vencer, assim como a lucidez da generosidade e respeito, a alegria de dançar a vida inteira com os irmãos.

PEDRO, ANTÔNIO E JOÃO
autor: Benedito Lacerda e Oswaldo Santiago
Com a filha de João
Antônio ia se casar,
mas Pedro fugiu com a noiva
na hora de ir pro altar.

A fogueira está queimando,
o balão está subindo,
Antônio estava chorando
e Pedro estava fugindo.

E no fim dessa história,
ao apagar-se a fogueira,
João consolava Antônio,
que caiu na bebedeira.


trabalho de Dinorah Oliveira

*Texto escrito em Junho de 2008

domingo, 19 de junho de 2011

Minha transgressão, raiva e cansaço

Há uns dias assisti ao programa de entrevistas Provocações, apresentado por Antônio Abujamra. Ele perguntava auma entrevistada o que tinha feito de mais transgressor na vida. Esta pergunta me chamou logo atenção e não lembro da resposta da convidada porque fiquei refletindo sobre as minhas transgressões. Eu achava que tinha feito muitas, comecei a lembrar de coisas, aprontes, pensamentos, mas logo percebi que nada era tão transgressor assim que pudesse responder ao entrevistador. A não ser o fato de ter escolhido a vida. Então achei a resposta para a questão: VIVER é o meu ato mais transgressor. Afirmo isso com todas as letras porque vivo num mundo que me diz o contrário, me estimula a não-vida, ao não-mundo. Sem acessibilidade e sem acesso às coisas como viver? É como se dissessem: oh meu filho, agradeça que você respira, se contente com isso, fique em casa tomando remédio, assisntindo a sua tv e nos deixe em paz, quietos. Você aqui nos atrapalha. Digo o mundo porque em nenhum lugar que já visitei é possível eu execer a liberdade de forma plena. Londres, Paris, Lisboa, Buenos Aires, São Paulo... em nehuma cidade dessa (nem conta as pequenas) há uma consciência sobre acesibilidade.  Umas com mais outras com menos, mas nenhuma completamente acessível. Eu teimoso e sem querer pensar na possibilidade de me excluir, insisto em me colocar na vida de forma plena, como uma postura política, como uma postura de luta, de briga, como escolha de vida.

Todo mundo quando vai sair para encontrar amigos ou paqueras, assistir a um espetáculo, beber um pouco com a turma, fazer uma noitada, se preocupa com o que vai usar, quer se fazer bonito para se sentir bem. Eu, além da roupa, tenho que pensar no arsenal que levarei à rua porque é certeza ter que lutar, o mínimo que seja, para que a noite seja proveitosa, para curtir o que me é direito.

Ontem esqueci e sai desarmado. Fui à Mouraria com uma amiga querida, companheira de tantas coisas, de perrengues até em Paris. Sentamos numa mesa na rua e conversamos animadamente, torcemos pelo futebol, falamos besteiras e tomamos cerveja. Como é sabido, cerveja é uma bebida diurética, poucos copos depois veio a vontade de ir ao banheiro. Nenhum bar do lugar (que pertence a mesma dona) tinha banheiro adaptado, para mim nem precisava seguir as regras (exigências de lei), mas que tivesse uma porta larga que a cadeira de rodas pudesse entrar. Eu já não aguentava mais de vontade e me dirigi a uma árvora para poder fazer minha necessidade. O bar fica atrás do Quartel da Mouraria. Quando acabei o "serviço" um militar colocou o rosto na janela da guarita e me repreendeu, dizendo que eu não podia ter feito aquilo. Expliquei a ele que em tese eu não deveria fazer, que sei que existe uma lei que combate este ato, mas que também existe uma lei que exige que todos os estabelicimentos tenham acessibilidade para pessoas com deficiência. Diante disse o que ele me indicaria a fazer? Ele despreparado completamente, me disse que não sabia onde eu podria ir, mas que eu não iria repetir aquilo. Minha amiga chegou e questionou a ele, criticando sua atitude. Ele então, bastante agressivo nos gritou:

- Olhe DESGRAÇA, eu disse que ele não vai mais fazer isso!

Saimos rápido porque sabíamos que uma pessoa dessa não é capaz de dialogar ou entender as situações, saber que existem coisas onde as regras têm que ser maleáveis, repensadas. Voltamos ao bar indignados e aproveitando que havia uma turma de advogados numa mesa ao lado explicamos o ocorrido e perguntamos o que deveríamos fazer. Primeiro era chamar a pessoa responsável  do bar para que tomasse alguma providência, uma vez que o constragimento e a agressão sofrida foi decorrente de uma falta do estabelicimento e que portanto deveria zelar pelos clientes e, no mínimo, fazer um comunicado ao Quartel. Enquanto conversávamos com os advogados, o militar da guarita chama três colegas que ficam na esquina, algusn instantes, com arma em punho. Lembro bastante de uma figura feminina entre eles. Depois se afastaram.

Chamamos o garçon que chamou a dona do bar. Esta teceu uma série de comentários desastrosos e preconceituosos, incluive perguntando porque voltei ao seu estabelicmento se eu já sabia que não tinha banheiro acessível. Ela já tinha colocado uma rampa na entrada do bar, que eu entrasse no banheiro feminino (que não dá passagem para a cadeira), que ela não poderia ser punida porque não foi ela quem me agrediu, que se eu queria processar porque acho que tenho direitos por ser deficiente, que... que.. que...

O advogado que estava conversando conosco se aproximou para explicá-la sobre a sua responsabilidade, tentando ver uma maneira de apaziguar a situação, mas ela demonstrava total ignorância e não reconhecia o problema provocado por ela, disse que vai abrir um banheiro e que esta era a única coisa que poderia fazer. que não entraria em contato com  o Quartel......

Enfim.... a noite acabou voltando para casa com a auto-estima destruida, com minha amiga arrasada, com todas as questões de desamparo, desalento, medo, ameaça, violência em nossos corpos, nossos peitos. O pior que não há um orgão que nos defenda. Porque lembro do problema que tive com o PROCOM e procurei o Ministério Público que me disse não entrar em briga com o Governo. Não tive um advogado que entrasse comigo na causa... e assim se repete todos os dias, todas as vezes. A Associação Baiana de Deficientes não tem uma assessoria jurídica que compre essas brigas. Então ficamos a mercê de uma briga isolada, individual e passando por chato, brigão, intolerante. O errado sou eu que decido sair e me defrontar com esse mundo perfeito, feliz e generoso.

Para completar, hoje precisei pegar um táxi, liguei para uma empresa e depois de muitos minutos me ligaram dizendo que não havia carro para pegar cadeira de rodas. Lembro que minha cadeira cabe até num fusca, porque desarma toda, tira roda, rodinha, pés.... Ou seja, assim como a dona do bar, uma empresa que deveria zelar pelos clientes, é conivente com os péssimos profissionais que se recusam a prestar o serviço a que se destinam. Um serviço, incluive, que são isentos de determinadas taxas, portanto menos impostos para nós, e prestam deserviço total. Não é a primeira vez que acontece isso e nem é a primeira ou única empresa que faz isso. Já dei queixa na Gtáxi umas três vezes e quando retorno a ligação, eles nem sabem do que estou falando, nem protocolam a queixa. Ficamos sem os direitos garantidos mais uma vez.

E eu tenho taxistas que me pegam, profissioanais ótimos que naquele momento estavam ocupados. Também não acho que eu tenha obrigação de ter uma lista telefônica de serviço particular porque as Elites Chame Ligue Táxi da vida, têm OBRIGAÇÂO de nos atender também.

Cansei.....

Pérolas aos poucos

(Composição : Zé Miguel Wisnik e Paulo Neves)

Eu jogo pérolas aos poucos ao mar
Eu quero ver as ondas se quebrar
Eu jogo pérolas pro céu
Pra quem pra você pra ninguém
Que vão cair na lama de onde vêm
Eu jogo ao fogo todo o meu sonhar
E o cego amor entrego ao deus dará
Solto nas notas da canção
Aberta a qualquer coração
Eu jogo pérolas ao céu e ao chão
Grão de areia
O sol se desfaz na concha escura
Lua cheia
O tempo se apura
Maré cheia
A doença traz a dor e a cura
E semeia
Grãos de resplendor
Na loucura
Eu jogo ao fogo todo o meu sonhar
Eu quero ver o fogo se queimar
E até no breu reconhecer
A flor que o acaso nos dá
Eu jogo pérolas ao deus dará

*Para mim esta música, na voz de Ná Ozetti, é uma das coisas mais lindas que já tive contato. Sublime!

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Infinito lugar

Hoje acordei melhor daquele sonho ruim. Tenho andado com medo. Há uma coisa forte em mim que me faz ter vontade de ir, sair, me aventurar... é como um desejo de vôo. Impossível desejo. Andei pensando que o fato de não andar, talvez, estimule isso. Desejar algo tão maior do que as possibilidades, porque o mais simples e comum eu também não posso fazer, entende? Então, tenho a capacidade de desejar o grande, o irreal, o infinito...
Tenho sentido muito amor, tenho recebido muito amor também. Tenho tido sensações diferentes por isso. Estou mais tranquilo, mais paciente, mais carinhoso até. Eu estou muito sensível pelos presentes que a vida tem me oferecido e a gratidão me deixa leve para ir aonde eu quero. E é longe. Muito longe de algum lugar. É mais. É quase como dançar.
(para o Candoco)
05/04/2011

foto Edu O.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Nada volta

Nada volta. Mudamos e nos transformamos a cada instante e o que de nós fica no outro é, muitas vezes, uma imagem congelada que não podemos mais corresponder.
Não é alegre nem triste.
Simplesmente é.

foto de André Baliú

domingo, 12 de junho de 2011

A viagem e Débora

A viagem

Uma viagem
sempre dá
Para tapar grandes buracos
- mas não todos -
Uma viagem...
Violentar o quarto e o dia arrumadinhos
O cheiro de mijo na escada
Tão comum que não se sente mais
Esta janela
- Boca de velha escancarada -
Cuspindo sol
Cuspindo vento e sol...

Violentar esta paisagem,
com a mesma violência em que já foi
"Misgalhada"
A mãozinha de criança
Numa engrenagem.

E como um toco de braço
Sangrando
Dar adeus:
Adeus meu quarto
Adeus meus amigos
Adeus meu Deus
E saber baixinho
Conversando, por exemplo, com a raiz dos cabelos
Que se parte ainda cheio de buracos
Buracos amarelos
Ou sem cor nenhuma
Buracos ocos
E infinitos na fundura
E sem saber jamais
A verdadeira extensão do adeus

Sônia Rangel


Deb me deu de presente esta poesia. Aliás ela me deu tanta coisa de presente, inclusive minha menina,  a mais linda de todas que já conheci. Minha afilhada. Sempre tive muitos amigos, mas nunca achei que ninguém me confiaria um filho para apadrinhar. Ela não teve escolha (kkkkkk) e me fez feliz demais. E depois veio Rudá e antes já tinha Michel que não era oficial ainda.

Houve um tempo, como agora, que ela vivia trabalhando numa outra cidade e me segredava coisas em cartas lindas, em confissões de tristezas e alegrias. Junto com uma dessas cartas, recebi este poema. Confesso que só agora ele caiu como uma ficha completando a ligação. Engraçado como absorvemos a arte no momento certo, no momento em que somos capaz de completá-la.

Nos conhecemos na Escola de Belas Artes. Lembro que Débora foi a primeira amizade construída ali dentro, dentre tantas, dentre muitas que tive a sorte de ter. Isso nos idos de 1995, ano que cheguei a Salvador, largando Santo Amaro. Largando pedaços de mim para trás.

De lá para cá nos acompanhamos de perto, mesmo se estamos longe. E já nos colamos em cada situação....( eu mais a ela do ela a mim kkkk). E vejo essa companhia para sempre, seguindo nossas vidas em paralelo, apoiando, rindo, chorando, discutindo, amando.....

A viagem só é boa quando em boa companhia....


mesmo ela dando autorização, sei que vai brigar comigo por publicar esta foto
Foto de Cathy Pollini

sábado, 11 de junho de 2011

Afeto, sempre o melhor a dar

Para mim o que há de melhor nessa vida são os encontros. Sempre estou aberto às pessoas, a conhecer gente nova, a permitir que nos encontremos e tenho recebido presentes maravilhosos com esta permissão. Sou muito feliz com os abraços e sorrisos e beijos e palavras de apreço. Afeto trocado marca a pele, o peito, os olhos. Afeto sempre é o melhor para se dar. Se doar.
Dando uma palhinha dos encontros que vocês verão domingo. Este video é lindo! Com música na voz de Jussara Silveira e a trilha incrível de SomdoRoque. Imagens captadas por Giltanei Amorim e editadas por Drica Rocha. Figurino de Nei Lima. E os intérpretes... vcs já sabem, eu e Lucas Valentim.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Gosto de aniversário de criança

"Memória tem gosto de aniversário de criança, mas pode ter outros sabores também. Depende da hora e da boca que sente"
Lucas Valentim na 7º confissão para Odete


Sei que nas vésperas de apresentação dos meus espetáculos fico parecendo gente gaga repetindo as coisas, falando do mesmo assunto, batendo na mesma tecla, mas não consigo não pensar em outra coisa.


Com Odete é uma experiência ainda mais forte porque releio as confissões, futuco nas caixas as coisinhas que guardamos para ela e relembro histórias, pessoas, fatos, fotos... como ela exige, como é o porque de fazê-la.


Refletindo sobre o lugar do outro em nossas vidas, nossos mortos (pessoas e situações) marcando nossos corpos. E tudo fica aqui registrado. Registrando. Digerindo.


Da última apresentação para cá tanta coisa mudou... O passarinho subiu do play e agora voamos mais juntos do que nunca. Adquiri bolsas no intestino, tantas que humilho a dondocas da Oscar Freire. O Corpo Perturbador chegou perturbando tudo e tomando um espaço gigante em mim. Pequetitas. Londres. Candoco. Fafá. Diane. Coração de mãe. Irmã. Sobrinho. Amigos novos. Os maravilhosos de sempre. E aqueles que se foram? São Paulo. Piauí. Feira de Santana. Marinha. Encontro. Marilyn.


Preciso beber água e respirar. Odeteeeeeee!!!!!!

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Olhares cruzados e expandidos (uma análise de Fafá Daltro sobre Odete)





Salvador 29 de Abril de 2010

Odete, Traga meus mortos.

Odete! Traga meus mortos, um espetáculo que trata das relações e trocas de experiências vivenciadas entre os coreógrafos intérpretes Edu O, e Lucas Valentim. Especialmente compartilhado com o público, a dramaturgia cênica traça uma trajetória que tem como sustentação a simplicidade do pensar fazer dança com delicadeza, sem excessos, num caminhar com calma como se fosse um dia ensolarado. A obra expõe num diálogo aberto e convidativo, seus modos de reconhecimentos nascidos das impressões entre seus corpos (entendidos aqui como corpomídia), e tendem a operar dentro de um processo permanente de troca de informações. Com olhares cruzados e expandidos, seus movimentos e histórias invadem e espalham-se pelo ambiente cênico contaminando a tudo e a todos, deixando-nos a vontade. Somos assim arrebatados, deslocados para o território da ficção, das mais variadas facetas da vida cotidiana e corriqueira dos autores, seus amores, humores e cumplicidades desnudados. Contaminados somos por suas fisicalidades estendidas, seus corpos idéias, e sentidos por onde passam. E tão perto estão dos nossos corpos que podemos usufruir dos mesmos sentimentos que exalam por onde transitam. Estamos implicados na cena. Um convite amistoso e provocativo se faz ouvir...,  quem quer tomar um cafezinho com a gente?,  Um suco? Quer contar alguma coisa?, ou, quem sabe dividir suas memórias, seus segredos? Tudo toma um ar de intimidade, de uma conversa entre amigos num fim de tarde. O entrar e sair da realidade, se faz sutilmente. Vivemos o intricado mundo visível e invisível do imagético. O público é convidado a participar da cena, complementado-a, colaborando com a sua feitura. Dessa forma, as fronteiras público espectador se rompem para dar lugar a um ambiente de compartilhamento. Pouco a pouco, o público sensibilizado, vai se aproximando para sentar ao redor da mesa (um pano estendido no chão), contando suas próprias histórias, provando cafezinho, bebericando suco, chá. Assim, colaborativamente, a mesa antes apenas com dois lugares se multiplica para acolher os convidados, totalmente contextualizados no espaço cênico. Esse novo formato da cena cria, estabelece uma dinâmica rica de trocas de pensamentos  e experiências vivenciadas, que se assemelham a um encontro festivo entre amigos (ausentes/mortos) de Odete. As cenas dispõem-se em diversos quadros, ora acentuando acontecimentos do passado, e em outras, suas releituras no momento presente, atualizando-as e modificando-as. Gradativamente e sorrateiramente um tecido poético começa a emergir impulsionado pelos diálogos corporais construídos pelos dançarinos e em acordos com o público presente, agora co-autor. A estética do espetáculo aporta ações colaborativas, ou seja, para uma melhor contextualização da cena há a necessidade da interferência do público, embora seu acontecimento possa ocorrer sem a atuação do público, o que consequentemente, daria outro colorido a cena. Várias dinâmicas dramatúrgicas compõem as ações do espetáculo cruzando diferentes níveis de descrição de construções de imagens que se delineiam através do fluxo de relações entre os dançarinos, as nuances da iluminação, na estruturação dos elementos que compõem a cena, no figurino, bem como nos diversos corpos/públicos presentes no ambiente. Todos os acontecimentos e suas releituras proporcionam diferentes estados corporais que surpreendem pela qualidade de organização e de poética. Esse desvelamento de acontecimentos e de estados corporais que emerge das ações dos dançarinos e de suas trajetórias no espaço/tempo da cena, se dá muitas vezes de forma inesperada e tão bem articulada, que no tempo de sua execução a invisibilidade se faz presente. Essa característica organizacional busca mostrar uma dança que se constrói a partir de impressões singulares, de experiências sentidas e percebidas entre seus autores através de processos de compartilhamento, e que não fazem parte do pensamento comum, do fazer da dança de combinações de passos. Esse é um ponto crucial dessa obra, o fazer da dança a partir das singularidades. O público é assim tomado de surpresa e de encantamento.

Lá no finzinho, um radinho de pilha nos remete ao passado. Da escada pode-se ver os convidados sentados ao redor da mesa posta, preenchida de canecas, biscoitos e idéias que se cruzaram, histórias subentendidas e veladas pela iluminação que recorta os corpos dos convidados. Fica a cargo do público sua complementação e interpretação. O radinho de pilha, uma canção francesa expõe a impressão da pequenina Louise, seu jeito de dançar contaminando os corpos, um presente para seu amigo.


 O espetáculo, delicado e sutil, mas imbuído de uma dramaticidade onde corpo e pensamento se encontram em um só movimento. Seus segredos, antes guardados, se dão a ver localizados agora em outros corpos, pois contaminados estão pelos acontecimentos imagéticos do espaço/ambiente/contexto cênico. A delicadeza se espalha, se funde e se desdobra metaforicamente num só corpo. Odete, o dia que perdemos o vôo, seus mortos, bôina verde, beliche, presenças, sabores, Lucas, contos, segredos, chás, memórias, o dia passando, Edu O, canecas, suas canções, lágrimas cortantes escorregando pelo rosto, piquenique, agora atravessam nossos corpos, estamos assim preenchidos uns pelos os outros, colaborativamente, co-autores implicados e responsáveis pelo fazer do lugar escolhido. As conexões tornam-se estreitas, os corpos tornam-se múltiplos, as imagens se transformam e nos transformam. A atmosfera poética constrói seu tecido expondo uma densidade, uma textura e uma viscosidade própria, compartilhada e móvel, porque suas margens irão mudar sempre a cada olhar, a cada idéia, a cada pensamento, a cada dia, a cada...sentir. 


Fafá  Daltro
Profa. Dra. Escola de Dança/UFBA.
Coreógrafa Grupo X Improvisação em Dança. 


Odete, traga meus mortos,
dia 12/06 (neste domingo), as 20h, no Theatro XVIII (Pelourinho), R$ 5,00
A convite do Núcleo Vagapara que apresenta seu Repertório de sexta a domingo, neste teatro.